Meu pai, o homem que é responsável por 80% do meu gosto musical, pela vontade de ler e de assistir tanta série e filme. Domingo de manhã lá em casa era cheio de Zeca Pagodinho, Abba, Elvis, Sinatra, Martinho da Vila… o som rolava alto enquanto ele ficava deitado, lendo. Ele sempre estava lendo alguma coisa, amava uma série literária cheia de volumes e que demoravam anos para serem concluídas. Leu Harry Potter, Percy Jackson, as séries do Cornwell e tantos outros, a biblioteca de casa sempre foi bem recheada. Fora as horas e horas que passava assistindo à jornais, lendo revista, acompanhando séries… desde que me lembro, se eu quisesse saber mais sobre um assunto, era ao meu pai que eu perguntava.
E aí veio o Alzheimer e, pouco a pouco, tirou isso do meu pai. Primeiro, parou de ler porque já não conseguia se concentrar. Depois, parou com os filmes e séries porque já não tinha paciência. Aí veio a música, que não sei porque também foi ficando escassa. As conversar ficaram mais curtas, permeadas pelos esquecimentos e a frustração de não conseguir dizer o que gostaria. Só restaram os jornais, que ele ainda assiste (infelizmente, porque a grande maioria são aqueles sanguinários que passam à tarde e o assustam com o mundo que mostram ali). E, assim, presentear meu pai nessa data foi ficando cada vez mais difícil.
Se antes eu mal precisava pensar em outras opções além de livros e DVDs acompanhados por uma barra de chocolate bem gostosa para deixar ele todo feliz, agora só me restam os doces. E doce cansa, por mais que a gente goste deles. Acabo que compro alguma peça de roupa, algum sapato ou algo assim, só para ter alguma coisa além da comida no embrulho. Embrulho que ele já nem se liga em abrir quando o recebe, porque acaba esquecendo que é para ele o presente.
É difícil. O pai que me criou está aqui pela metade, mas continuo feliz em ter pelo menos parte dele ainda com a gente. Que sorte comemorar os 76 do Véio Zaldir, mesmo que de longe por causa da pandemia. <3